Não
existe data mais importante para o gaúcho
do que o 20 de setembro. Neste dia, comemoramos
a Revolução Farroupilha, andamos
pilchados, assamos churrasco e bebemos mate
– não que nos outros dias não
façamos a mesma coisa, mas neste dia
é especial. Foi num 20 de setembro que
o Rio Grande do Sul tornou-se país, uma
República em época de Brasil Império.
Com orgulho cantamos nosso hino: “Mostremos
valor constância; Nesta ímpia e
injusta guerra; Sirvam nossas façanhas
de modelo a toda terra”. Ostentamos com orgulho
nossa tradição e nosso passado.
Fomos forjados no calor da guerra (Guerra da
Cisplatina, Revolução Farroupilha,
Guerra do Paraguai, Revolução
Federalista, Revolução de 23,
Revolução de 30, Campanha da Legalidade,
etc.). Nenhum Estado brasileiro lutou tanto
por si e pelo Brasil como o Rio Grande do Sul.
Hoje, não existem mais guerras para serem
travadas.
Por isso, não é só nosso
passado que nos enche de orgulho. O presente
também. Seja na política, na cultura
ou no esporte, somos orgulhosos de quem somos.
Como no caso do futebol. Neste moderno campo
de batalha defendemos mais do que nossas tradições,
defendemos quem nós somos.
Assim como na Revolução Farroupilha,
no Campeonato Brasileiro, defendemos nossa honra,
lutamos contra as injustiças do poder
central e buscamos nossa autonomia.
Para sermos campeões precisamos vencer
o adversário, o juiz, o STJD, a imprensa
e a opinião pública. Tarefa muito
penosa. Talvez, por isso, não vençamos
o Brasileirão há tanto tempo.
São inimigos de mais para serem batidos.
Neste ponto sou obrigado a concordar com o gremista
Eduardo ‘Peninha’ Bueno, que afirmou que o Brasileirão
só tem uma função: dar
vaga à Libertadores da América.
Pois, segundo ele, a Libertadores é o
campeonato que vale de verdade. Curiosamente
tirando o São Paulo, os clubes que costumam
“vencer” o Campeonato Brasileiro não
tem muito sucesso na Libertadores. Por que será?
Bom, esse é assunto para outro dia.
Assim como pensa o Peninha, pensa a maior parte
do povo gaúcho, seja colorado ou gremista.
O que vale mesmo é a Libertadores. Pois,
é uma questão de hierarquia de
campeonatos.
Quando os Farrapos marchavam para guerra, sua
fama os precedia. Eram homens que há
anos lutavam pela manutenção da
fronteira do Brasil, eram homens ariscos, homens
de guerra. Haviam lutado contra bandeirantes,
castelhanos e indígenas. Eram homens
forjados na guerra, que ostentavam vitórias
em infinitas batalhas.
Da mesma forma, quando Internacional e Grêmio
entram no gramado para a peleja, sua fama os
precede. Somados os dois clubes têm 2
títulos mundiais, 4 Libertadores, 2 Recopas
Sulamericanas, 1 Copa Sulamericana, 1 Suruga
Cup, 5 Campeonatos Brasileiro e 5 Copas do Brasil.
Isso ficando nos campeonatos oficiais. E sem
contar que o Internacional vai disputar o Mundial
de Clubes da FIFA no mês que vem (também
já estando na final da Recopa Sulamericana
de 2011).
Mas afinal, o que é? e quem é
o gaúcho?
O gaúcho nasceu de uma combinação
de etnias. Europeus (portugueses, espanhóis
e, mais tarde, italianos e alemães),
africanos (escravos) e indígenas (minuanos,
guaranis e charruas).
Gaúcho era um termo pejorativo para homens
desgarrados – alguns eram ladrões de
gado –, que montavam cavalos “em pelo”, ou seja,
sem sela. Eram homens rústicos, que viviam
no campo. Eram os "guacho", que significa
"órfão" e refere-se
aos filhos de índia com o branco espanhol
ou português. Somente em meados do século
XIX o termo deixou de ser depreciativo.
Gaúcho é uma miscelânea.
Todo gaúcho é meio brasileiro
e meio castelhano. Todo gaúcho é
meio africano e meio charrua.
Como afirmou, certa vez, o colorado Luís
Augusto Fischer, no Rio Grande do Sul alguns
tendem a ser mais brasileiros do que castelhanos,
já outros mais castelhanos do que brasileiros.
Isso faz bela e única nossa terra e nosso
povo. São de contrastes e contradições
que o gaúcho é forjado.
Assim, o Rio Grande do Sul elegeu o metalúrgico
Lula presidente do país em 1989 (no Rio
Grande, Lula venceu Fernando Collor nos dois
turnos). Assim como o negro Alceu Collares e
o gaudério Olívio Dutra foram
eleitos governadores do Estado. Yeda, uma mulher,
foi eleita governadora. Antes, o Rio Grande
fora berço da Revolução
de 30 e das Reformas de Base do Jango. Mas também
foi terra dos ditadores Costa e Silva, Médici
e Geisel. Somos terra de contradições!
Se Tarso Genro, do Partido dos Trabalhadores
(PT), é nosso governador, o Partido Progressista
(PP) é o partido com o maior número
de prefeituras no Estado. Lembrem que se o PT
é partido de esquerda, o PP é
de direita (foi base de apoio à ditadura
no Brasil – na época chamava-se Arena).
Não somos uma massa homogenia. Somos
diferentes, divergentes e contraditórios.
Porém, somos todos irmãos. Pois
somos todos gaúchos. Para ser gaúcho
basta querer, não é necessário
nascer aqui, para ser gaúcho tem que
pensar como pensam os gaúchos.
Gaúcho é quase uma ideologia.
Gaúcho é um modus vivendis. Pois
concordamos em discordar. Concordamos em sermos
diferentes.
Assim, também são colorados e
gremistas. São contraditórios,
são rivais, mas estão sempre próximos
um do outro. Não vive um sem o outro.
E, como todo gaúcho, são irmãos.
Desta forma, seguiremos em nossas batalhas,
com nossa fama nos precedendo. E que “sirvam
nossas façanhas de modelo a toda Terra”.